Maria da Penha

Maria da Penha

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

A cegueira

Olha, olha não consegue ver.
Você sabe que não ficou cego
Mas não entende porque não enxerga
Mas você sabe que está sobre a ponte
E sabe que o mar azul está adiante
Existem navios no horizonte
Você tem consciência de tudo
Mas não consegue ver
Ei? Não tente abrir mais os olhos
Você não vê por falta da visão
O muro é muito mais alto
Faça o esforço para subir até o topo
É muito alto, e você não suporta mais o cansaço?
Tente mais uma vez.
Sente-se fraco
Não tem mais tempo?
Dê mais uma gota do seu sangue
Sei que é a última gota
Está quase, vai.
Sente-se melhor agora?
Você chegou ao topo.
Mas o seu corpo é só dor
Você demorou demais
O muro é alto
E não teve tempo de ver os navios
A correnteza mudou a cor do mar.
Não salte agora.
Use a sua imaginação.
Tente enxergar assim mesmo.

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Você corre

Você corre, corre atrás de um sonho.
Mas você não conhece o sonho
Então, você vaga de um lado para o outro,
Considerando as coisas pontuais como realizadas
Mas você volta para casa
Fica ali calado
Frio
Embutido
Imundo
Moribundo
Chora e ri embriagado
A noite cai
O estomago enjoado
Adormece
E o sonho que sequer foi sonhado
Morre com o sono
O dia nasce novamente
E você volta a correr e corre atrás do sonho.

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Tempo

Você achou que o tempo não passaria?
Tentou se convencer de que nada aconteceria?
Fez com que o seu cérebro queimasse no alto-forno?
Esqueceu-se de que o fogo queima?
Mas o produto escorreu
Petrificou com o ar
Tentou a picareta para quebrar e nada
Tentou um componente químico
Mas a química não permitiu que se liquidificasse novamente
Pronto, você envelheceu e ficou pronto.
Nada mais é capaz de modificar
Nem os vermes conseguirão devorar
E você ainda nem percebeu
Que o tempo passou e se foi para bem longe
Nem é capaz de processar lembranças e a dor aumenta
Mas o que solidificou nem pensa
Só sofre e nem sabe discernir em que consiste.

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Escrevo

Na segunda-feira, escrevo;
Na terça e quarta, também;
Às vezes escrevo na quinta e
Na sexta quando sinto que convém.
Escrevo nos fins de semana
Nos feriados escrevo quando me apetece;
Em momento de orgulho
No mundo que é só meu
Faço a hora de escrever.
Pasmo sempre quando leio
Admito que não seja eu.
Mas escrevo que importa?
Mais me admira quem não o faz,
Nada sente nada pensa, pois
Nada tem por dizer.
Faço sentir nas palavras
Momentos obscuros de reflexão;
De amor e ódio sou cúmplice;
Hoje entendo o que escrevo, amanhã
Talvez, não.
Que importa então?
Não entendo muito das palavras,
Não sou poetisa
E seria muita audácia
Se a quisesse ser.

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Morrer

Eu não queria que você me matasse assim,
Preferiria que fosse por uma forma mais branda.
Que não fosse da mesma maneira que já tentou me matar num passado distante, através da mesmice já conhecida por mim, pelo distanciamento na tentativa de reconstruir uma vida com outra pessoa, distanciando-se para fugir.
Queria morrer alimentando um sentimento.
Morrer pela busca, pela procura, pelas belas palavras mesmo que contraditórias.
Morrer pela poesia pobre e insignificante, pela conquista constante.
Morrer pela esperança dos beijos e abraços mesmo que não venham a acontecer.
Morrer sabendo que ficou uma linda história de vida, de paixão de amor e de uma grande e verdadeira amizade.
Mas assim não, matar-me assim é dizer-me que tudo foi em vão, que eu não devo mais sonhar e muito menos planejar quaisquer possibilidades de retorno.
Matar-me assim é deixar explícito que não sou nada, que não fui nada e esquecer-se que sempre e em qualquer situação existem dois lados.
Matar-me assim é mostrar-me o que você sempre foi e que não consegue alimentar nada além de você próprio, do seu orgulho e é capaz de viver de aventuras mornas valendo-se de qualquer coisa.
Matar-me assim, é não se dar o direito do que realmente você deseja.
Matar-me assim é demonstrar que o amor só existe se for carnal.
Matar-me assim é achar que existem distâncias, e que o amor a elas não resiste.
Matar-me assim é matar todas as minhas possibilidades e deixar-me livre para reconstruir novamente do zero a minha própria vida.
Matar-me assim é não ter consciência de que vou ter de buscar alguém para mim e infelizmente para você, que se diz saber tudo, esse alguém eu ainda não sei quem é, mas também não é e nem nunca foi quem você sempre imaginou.
Eu não queria que você me matasse assim.

Adeus.

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Descarte

Descarte a carta que te prende ao jogo
A angústia do egoísmo evasivo
Por abnegação o incontestável
A patente vulnerável.

Descarte meu caro
A serenidade do rio onde tu lamentas
A seriedade de como tu gargalhas
O triste riso do palhaço.

Descarte a empáfia
O rigor não excessivo
O ato fastidioso
A clarividência do fato.

Descarte a literatura sem censura
O rito benevolente
O peso ao revés
A desafinação da autoria.

Descarte o lhano
Que de cândido e despretensioso nada tem.
DescARTE
Não, a arte de Descartes.

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Odeio

Odeio o sorriso pálido
Odeio os bons dias sem nexo
Odeio a muito obrigada
Odeio o silêncio alheio
Odeio quem muito fala
Odeio a voz meiga massageada
Odeio quem desfila sem palco
Odeio aceitar o imperdoável
Odeio as sanguessugas
Odeio as juras secretas
Odeio o cheiro das flores mortas
Odeio a política
Odeio religião
Odeio a falta de espiritualidade
Odeio quem reverencia
Odeio a inércia destemida
Odeio carros e casas de outros
Odeio gente fedorenta
Odeio o perfeccionismo
Odeio compromissos indigestos
Odeio gente
Odeio quem dissimula o ódio
Odeio com todo o meu ódio
Ódio de quem sabe odiar.